terça-feira, 20 de novembro de 2012

Igreja católica se rende aos cultos dos milagres. Paróquia de Vila Velha vive lotada de fiéis em busca de milagres.


Foto: Vitor Jubini - GZ


Os momentos de cura são os mais aguardados pelos frequentadores da celebração. Quem não consegue entrar fica do lado de fora, acompanhando por um telão instalado no pátio. Caravanas saem do interior para a missa
Num tempo em que a Igreja Católica só faz encolher frente ao avanço dos evangélicos, um fenômeno tem chamado a atenção na igreja matriz da Glória, em Vila Velha. Lá, a celebração realizada sempre nas primeiras segundas-feiras do mês – chamada de "Missa de Ação de Graças" – é garantia de público certo. É tanta gente que muitos têm que ficar do lado de fora, acompanhando tudo por um telão instalado no pátio.

A reunião, sob o comando do padre Vandaike Costa Araújo, atrai caravanas de diversas partes do Estado, como Domingos Martins, Marechal Floriano e Conceição do Castelo, trazendo na bagagem o desejo da cura dos males físicos ou espirituais ou simplesmente a vontade de agradecer por uma graça já recebida.

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Não é uma missa comum. A celebração é emoção pura, que transborda em cada palavra e nos momentos de oração e canções entoadas em coro pelos fiéis. E o número de pessoas que afirmam terem sido curadas durante a missa só faz crescer. Esses fiéis não hesitam em ir à frente do púlpito para dar seu testemunho. Os relatos são tantos que a equipe do padre pretende reuni-los em livro.

"Não é o padre que cura, é Jesus. Ele pode curar em todas as missas", diz padre Vandaike, que frisa: não faz esse tipo de celebração para se promover.

É tanta gente que até entrar na igreja é difícil. A multidão não deixa um espaço vazio nos bancos ou nas cadeiras azuis que aumentam os lugares disponíveis. Fiéis acomodam-se até nos degraus de acesso ao altar. Do lado de fora, uma tenda abriga outras centenas, que acompanham a missa por um telão. Só nesse espaço há mais fiéis do que nas celebrações de muitas comunidades da Grande Vitória.

"Não é show"Logo no começo da missa, padre Vandaike faz questão de avisar: "Isso aqui não é um show da fé", fazendo uma alusão ao programa do tele-evangelista neopentecostal R.R. Soares. O sacerdote, adepto do movimento da Renovação Carismática Católica (RCC), rejeita a comparação com os rituais de cura que fazem sucesso nas igrejas neopentecostais.

É a fé na cura que move a maioria dos frequentadores. É gente que tem certeza de que estar lá faz a diferença, como a dona de casa Ana Maria da Penha Volkers, de Domingos Martins. Ela garante que teve a cura de tumores pelo corpo "revelada" durante uma das missas. "Ia ao médico e nada me curava, até que na missa passada o padre disse que tinha uma pessoa aqui com vários tumores pelo corpo. Depois disso, eles desapareceram", conta.

As "revelações", como aconteceu com ela, são um dos pontos altos da celebração: é quando o sacerdote diz que fiéis ali presentes estão sendo curados.

O rito católico tradicional não é deixado de lado, mas ganha temperos adicionais, com orações demoradas enfatizando a cura dos mais diversos tipos de doenças. Marca registrada da Renovação Carismática e de várias igrejas evangélicas, a chamada oração em línguas – repetição de sílabas que lembra uma espécie de mantra –- também é adotada pelo sacerdote.
Foto: Vitor Jubini - GZ


Forma de evangelizar - "Em toda missa, Jesus Cristo pode curar" - Vandaike Costa Araújo,padre da Paróquia da Glória

Vandaike Costa Araújo  tem 43 anos, é padre há nove, dos quais há pelo menos sete celebra missas com orações por cura.  Adepto da Renovação Carismática Católica, faz questão de dizer que não celebra visando à promoção pessoal.

Como são as  missas celebradas pelo senhor na primeira segunda-feira do mês?
É importante dizer que são missas de ação de graças. Temos louvores, oração por cura e libertação e também bênção da água, dos objetos.  Dinamizo para que as pessoas possam participar melhor, mas sempre sigo as orientações da Igreja, da liturgia do ritual.

Essas orações assemelham-se às orações de cura realizadas nas igrejas evangélicas?
Não, porque evangelizamos de outra forma. Muitas igrejas evangélicas – e eu não digo todas – trabalham muito a questão do show, do consumismo, do dinheiro. Aqui não é um show da fé. A missa é uma festa do mistério da paixão, morte e ressurreição de Jesus. Ele cura através da missa, porque é o sacramento que ele instituiu 
na ceia derradeira.

Missas como essas são uma tentativa de recuperar fiéis para a Igreja ou de conquistar espaço?
Não buscamos garantir espaço nem fazemos isso para promover a pessoa do padre. O que nós queremos é aumentar a fé do cristão católico. Há várias pessoas que estão sendo curadas através das missas e pessoas que retornaram para a Igreja e começaram a entender a importância da fé.

O que há de especial nas missas de ação de graças?
Em toda missa Jesus cura. Nesta missa, nós promovemos uma evangelização para que o fiel valorize a importância da missa e de sua perseverança na comunidade. Sou apenas um instrumento de Deus para fazer com que as pessoas vivenciem cada momento da missa, levando-os ao perdão, à escuta da palavra, ao poder da pregação e da própria comunhão.

A cura é um tema que precisa ser tratado com cuidado?
Quando a pessoa testemunha que foi curada, peço para trazer os exames médicos para comprovar. Muitas curas acontecem de fato. Sempre falo para a pessoa continuar o tratamento,  porque Deus também cura através da medicina, porque Ele dá sabedoria aos médicos.

Missionário

No último dia 5, a missa contou com a participação do missionário leigo Roberto Tannus, que prega cura e libertação em vários lugares do mundo. "Há alguém aqui que está sendo curado de uma dor na coluna porque caiu e sofreu um acidente. Em nome de Jesus, se levante e coloque suas mãos na ponta dos pés", proclama Tannus. Como ninguém se levantava, ele volta a chamar.

"Eu tenho certeza de que alguém aqui está sendo curado", repetiu, afirmando que a pessoa sofrera um acidente em casa. A insistência continua até que uma fiel se levanta e faz o exercício pedido. Ela balança os braços para agradecer pela cura, enquanto o público aplaude com entusiasmo.

Antes, as missas em que aconteciam esse tipo de orações eram chamadas de "missas de cura", nome que não é mais adotado, por recomendação da Igreja. A prática não é nova. No começo da década de 1990, o padre Afonso Pastore, já falecido, fazia essas celebrações em Vitória.

ReservasApesar do sucesso de público, na Arquidiocese de Vitória a celebração é vista com reservas. Procurado por A GAZETA, o arcebispo dom Luiz Mancilha Vilela preferiu não dar entrevista. A reportagem chegou a receber ligações de fiéis que pediam para a matéria não ser publicada. O temor é de que o padre seja proibido de celebrar esse tipo de missa.

Padre Vandaike, no entanto, garante que as celebrações estão respaldadas em documentos do Vaticano e que segue o que a Arquidiocese determina.

Para o teólogo Vitor Nunes Rosa, especialista em Religião de A GAZETA, a Igreja não pode ignorar que há um movimento em curso e deveria fazer um controle saudável dessas práticas. "É perigoso mobilizar as pessoas somente em busca de cura. Pode-se criar uma visão pragmática nos fiéis, de um Deus super-homem", pondera.
Foto: Vitor Jubini - GZ


Graça alcançada -"Minha filha, que não andava nem falava, hoje é uma criança normal" -
Eliete Duarte Brito - Costureira, 46 anos
A costureira Eliete Duarte Brito, 46 anos, mal consegue conter a emoção ao lembrar que sua filha Elisa, aos 4 anos,  não andava, não falava e tinha problemas de crescimento. Hoje, ela é uma menina saudável que corre e brinca como qualquer outra criança. Eliete não tem dúvidas: a cura veio numa missa celebrada pelo padre Vandaike. "Quando o padre passou com o ostensório – peça em que fica exposta a hóstia –, ele disse que alguém estava sendo curado naquele momento e que a pessoa iria dormir. Nesse momento, ela ficou esticadinha e dormiu, até as 7h do outro dia", relata. No dia seguinte, para a surpresa da mãe, Elisa conseguiu se levantar da cama sozinha. "Hoje ela é uma criança normal", comemora. Foi Eliete que disse ter sido curada de uma dor na coluna na missa do último dia 5, quando o missionário Roberto Tannus afirmou que alguém estava sendo curado de dores que começaram após uma queda. "Essa dor começou quando tinha de carregar a Elisa." É por tantas graças que ela não se importa – aliás, faz questão –  de sair de Domingos Martins para ir à missa.




Fonte: A Gazeta

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